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.2010 - Volumen 3, Número 3
 
     
Políticas de Avaliação das Escolas em Portugal
 
Maria do Carmo Clímaco
 

     

1. Avaliação das escolas em Portugal - Contextos e iniciativas

A questão política e técnica da avaliação das escolas aparece de forma recorrente em Portugal em meados dos anos 80 e decorre essencialmente dos efeitos da contaminação das políticas derivadas da progressiva internacionalização do país (Barroso, 2006), quer por iniciativa dos serviços centrais da administração educativa e da sua interpretação dos objectivos dos programas dos governos, no caso das escolas públicas, quer por iniciativa de agentes privados associados a entidades académicas ou envolvidos em redes internacionais de estabelecimentos de ensino, no caso das escolas privadas.

Independentemente da sua orientação política, foram muito poucos os programas de governo que, de forma explícita, inseriram a questão da avaliação das escolas como objectivo político ou como estratégia. Frequentemente, os programas dos Governos nos seus objectivos programáticos mencionam a questão da “reforma e modernização educativa”, apresentada como “um desafio nacional” e referem questões relacionadas com a qualidade da educação escolar, referindo um conjunto de prioridades de acção governativa, especificamente:

  • a “melhoria da qualidade da educação, actuando prioritariamente sobre a reforma curricular”;
  • a “reforma da administração educacional, com ênfase claro no reforço da autonomia da escola” ;
  • papel da escola como “núcleo activo de promoção e alianças estratégicas entre os vários intervenientes da comunidade educativa” ;
  • a necessidade de “mais intensa participação da comunidade na gestão da escola, com especial relevo para os pais, os empregadores, as autarquias e instituições locais”;
  • “desenvolvimento de mecanismos de informação e comunicação com os clientes do sistema, por forma a fomentar a transparência e as responsabilidades acrescidas da escola perante a comunidade”.{1}

Não sendo a avaliação das escolas um objectivo expresso neste programa, foi no entanto neste período que foram construídas as bases necessárias para que surgissem diferentes iniciativas quer na esfera das escolas públicas, quer na esfera das escolas privadas.

No diploma{2} que estabelece o enquadramento político e normativo da autonomia das escolas refere-se também que, “ o Ministério da Educação adoptará as estruturas e mecanismos normais adequados para proceder à avaliação sistemática da qualidade pedagógica e dos resultados educativos das escolas sujeitas ao regime definido no presente diploma”

Este pensamento foi contemporâneo das iniciativas internacionais de revisão e aperfeiçoamento dos sistemas de informação, especificamente as que foram conduzidas pela OCDE e que tinham como objectivo rever os sistemas de informação na área da educação, desenvolver novos indicadores para analisar e avaliar o desenvolvimento e a qualidade dos sistemas educativos{3}e, especificamente, adequá-los à avaliação do desempenho das escolas. Em vários estados membros as equipas nacionais colaboradoras da Rede C fizeram reflectir as orientações do projecto internacional na selecção, organização e produção de indicadores específicos para análise do desempenho das escolas, com o objectivo de melhorar o sistema de informação e testar o potencial informativo e heurístico daqueles instrumentos, como aconteceu em Portugal.

Podem-se encontrar diferentes enquadramentos conceptuais para justificar a produção dos indicadores de desempenho dos sistemas educativos em cada uma das redes deste projecto internacional, das teorias das organizações às teorias do controlo e da regulação. No que se refere aos critérios de selecção dos indicadores para descrever e avaliar as escolas, na rede C (desempenho das escolas) era muito explícita a influência da investigação sobre a eficácia das escolas e a sua relação com as políticas de equidade. A discussão do que se entendia por “uma escola de qualidade” ou por “uma boa escola” fez parte de vários fóruns nacionais e internacionais criados durante os anos 90, quer sob a égide da OCDE quer da própria União Europeia. Os seus objectivos eram os de aprofundar as dimensões que estão em jogo na definição da qualidade da escola e saber até que ponto as perspectivas divergiam conforme os actores participantes e poder confrontar o conhecimento produzido pela investigação com as orientações das políticas dominantes.

A educação comparada conheceu um novo rigor metodológico e uma relevância política consideráveis. A internacionalização das políticas contaminou as soluções encontradas em cada país para avaliar as escolas, identificadas como a “caixa negra” do sistema (Scheerens, 1997), ou o nível crítico onde se processam todas as diferenças qualitativas dos sistemas educativos.
Neste contexto, quer no quadro das políticas da modernização e da descentralização da administração educativa em Portugal, quer no âmbito da criação de mecanismos melhoria da qualidade da educação escolar, foram desenvolvidos projectos de monitorização e avaliação de largos sectores da vida das escolas nas modalidades de auto-avaliação e de avaliação externa, como vinha acontecendo em vários países de um e outro lado do Atlântico, nuns casos com carácter de projectos experimentais, frequentemente mais consentâneos com as características de investigação - acção, noutros casos com carácter de intervenção de regulação, explicitamente de avaliação externa.

1.1. A auto-avaliação para todas as escolas PEPT-2000

No âmbito do Programa Educação para Todos – PEPT-2000, criado para dar corpo ao desiderato do XI Governo (1987/91) de tornar obrigatório o cumprimento universal da escolaridade básica de 9 anos para todos os alunos até ao horizonte do ano 2000, foi instituída, em 1991, uma componente obrigatória de auto avaliação para todas as escolas candidatas e apoiadas por este Programa, que se obrigavam a criar um “Observatório da Qualidade da escola” (OQE). Como material de apoio essencial para as escolas organizarem os seus dispositivos de recolha e análise de informação, foi distribuído às escolas um Guião organizador desse dispositivo, onde se apresentava uma selecção de 15 indicadores quantitativos e qualitativos, dos quais as escolas eram convidadas a seleccionar 10, conforme a sua adequação ao seu projecto educativo. No seu conjunto esta selecção de indicadores cobria aspectos como os relativos aos resultados escolares, à caracterização da população escolar tendo em conta as características socioeconómicas e educacionais das famílias, os recursos humanos e os recursos físicos e tecnológicos, o nível e tipo de participação na vida da escola por parte de todos os implicados (professores, alunos, famílias e pessoal não docente), a coesão do corpo docente e o nível de satisfação de todos os actores. O primeiro objectivo destas tarefas era levar as escolas a adquirir competências na área do tratamento e análise da sua própria informação e tornar consciente a importância da tomada de decisão baseada em conhecimento e não em opiniões individuais ou na norma descontextualizada. Por isso, para cada indicador se apresentava a sua definição, o processo e os instrumentos para recolha e tratamento de dados, bem como a justificação da sua relevância. Como princípios justificativos e orientadores da auto-avaliação em cada escola, sublinhava-se o seu contributo como condição de autonomia e de participação activa.

A recolha sistemática da informação tornava possível a sua análise longitudinal, para conhecer a evolução da escola. O tratamento e a análise partilhada da informação a nível de escola era considerada em si mesmo um potencial contributo para a mobilização dos actores e, desse modo, “para a qualidade da escola, significando melhorar a sua capacidade de responder às necessidades de aprendizagem”,… “mobilizar as comunidades educativas em torno das suas escolas” e …“introduzir uma reforma cultural na gestão escolar, tornando-a transparente e rigorosa, capaz de se planear de uma forma estratégica e de avaliar os seus próprios resultados, orientada por princípios de democraticidade e de eficácia” (Guião Organizativo do OQE, p.7-8).

O formato de auto avaliação decorreu da convicção de que as políticas da melhoria da qualidade da educação precisam tanto do apoio e da vontade dos políticos e da administração educativa, como do esforço reflectido em cada escola sobre a capacidade de fazer melhor. Esse esforço implica auto conhecimento.

O “Observatório da Qualidade da Escola” foi um duro processo de aprendizagem para muitas escolas, que por tradição não tratavam nenhum dos dados com que alimentavam as estatísticas nacionais, nem tinham sentido a sua falta. A sua surpresa foi descobrir como podiam pensar a sua escola “lendo” o significado dos números em cada indicador e comparar-se com outras escolas semelhantes. Durante os 10 anos de vigência do PEPT-2000, o “Observatório” foi essencialmente um projecto voluntarista dos seus promotores e das mais de 1000 escolas abrangidas, que receberam o apoio executivo mínimo por parte da administração educativa, para que não fossem desenvolvidas dependências burocráticas, contrárias à autonomia que se procurava.

O facto de ser possível às escolas contratar um “consultor” ou “amigo crítico” que as assessorasse nesse processo contribuiu para produzir conhecimento e reflexão diversificados sobre o desempenho das escolas e sobre as questões que lhes estão associadas. Na sua esteira, foram realizados e divulgados vários trabalhos académicos, tendo como objecto de estudo a avaliação do desempenho das escolas nos termos propostos pelo projecto. Por arrastamento, foram desenvolvidos outros “objectos de estudo” paralelos e outras formas de abordar a análise da qualidade das escolas, numa perspectiva metodológica predominantemente qualitativa, orientada para a compreensão dos objectos de estudo e menos focalizada na sua descrição “objectiva” e estatística.

Como refere Canário (1995), o ponto de entrada mais comum para a análise e a avaliação do desempenho educativo, fez – se tradicionalmente a partir da análise do Sistema Educativo, visto como um conglomerado de escolas, recorrendo à informação estatística centralmente recolhida, de forma sistemática. Poder olhar de perto as estatísticas de cada escola em conjunto com outra informação de diferente natureza, e poder procurar perceber como se criavam singularidades dentro da escola vista não como unidade periférica, mas como um sistema em si mesmo, era ter acesso a “uma porta de entrada” para o estudo da escola que normalmente não estava facilitada a muitos investigadores e estudiosos, agora tornados amigos críticos de “escolas PEPT”.

1.2. As iniciativas no âmbito da “Gestão da Qualidade” e da “Excelência”

Foram contemporâneas daquele projecto outras modalidades de autoavaliação, sobretudo as inspiradas no modelo da EFQM (Fundação Europeia para a Gestão da Qualidade), como o modelo CAF, cujos princípios orientadores são inspirados pelas teorias da Gestão da Qualidade Total. Foram as escolas particulares e cooperativas que mais consistentemente utilizaram a sua metodologia e organizaram as bases para o seu desenvolvimento, recorrendo à assessoria de um especialista e investigador universitário. Em várias zonas do país, ainda que de forma menos sistemática, muitas escolas públicas seguiram o exemplo, por opção, utilizando toda a instrumentação que fora produzida e entretanto divulgada.

O modelo EFQM assenta num corpo teórico de oito princípios fundamentais da “excelência” na gestão das organizações e que a definem como sustentável, a partir da sua articulação num “ciclo de qualidade”, de forma sistemática, continuamente revistos e melhorados. Os princípios que definem a sustentabilidade do modelo são, em primeiro lugar, a orientação para os resultados, e para os atingir, a focalização nos clientes ou usuários, a liderança e solidez dos objectivos, a gestão por processos e factos, o desenvolvimento e participação das pessoas, a aprendizagem, a inovação e melhoria contínuas, o desenvolvimento de parcerias e a responsabilidade social.

A sua matriz teórica com raízes na gestão de empresas e o discurso específico que a caracteriza foi fácil de absorver pelas escolas que dispõem de autonomia quer na gestão do seu projecto educativo, quer na gestão de processos e recursos. Mas a sua importação para as escolas públicas, mesmo quando adaptado{4}, não se tornou fácil de acomodar à sua cultura de conformidade ou à burocracia profissional, pondo em evidência que para além da competência pedagógica, científica, social e ética, as escolas precisam de se desprender do seu discurso cristalizado, avesso ao discurso técnico da organização e gestão de recursos, ou da análise de resultados conduzida com rigor. Do mesmo modo, precisam da cultura da invenção e do risco para conseguirem ir mais longe no seu desenvolvimento e melhoria, respondendo aos seus contextos específicos. Os contextos têm de ser vistos como desafios e oportunidades de uma outra acção e não como justificativas do que não se consegue alcançar.

1.3. O Estado regulador e os novos modelos de prestação de contas

A par destes “exercícios” de modernização da administração pública, outras fontes de influência têm feito sentir-se no modo como se encara a urgência de melhorar os resultados da educação e, por arrastamento, a prestação do serviço educativo. Decorrente da internacionalização do país, políticos e técnicos têm conhecido mais de perto as políticas de promoção da qualidade das escolas em uso noutros países Europeus, que se tornam fontes de inspiração para as políticas de modernização educativa.

Por toda a Europa assiste-se à reconceptualização do papel do Estado no desenvolvimento dos sistemas educativos, decorrente quer da expansão de políticas de tendência neo-liberal na gestão educativa com a valorização da autonomia das escolas e da liberdade de organizar o ensino e de escolher a escola de acordo com valores laicos ou confessionais (Afonso, 2003), quer do reforço das políticas de regulação e do controlo, mesmo em países onde a autonomia das escolas e um poder forte dos professores parecia uma tradição consolidada.

A estandardização dos exames, o uso de provas aferidas, a avaliação das escolas por entidades externas credíveis e a autoavaliação das escolas foram-se tornando obrigatórios e usados como elementos reguladores das práticas educativas em muitos dos países dominantes, estendendo-se aos mais periféricos. A publicitação dos resultados dos alunos e das listas ordenadas das escolas a partir desses resultados tornaram-se formas de prestação de contas da “qualidade educativa” dos estabelecimentos escolares em vários países europeus, cujos efeitos se fizeram sentir quer nas políticas de financiamento da educação, quer na crescente competitividade entre escolas para garantir a sua procura pelos melhores alunos, quer na invocação do direito parental a escolher a melhor escola para os seus educandos. As regras do mercado invadem o mundo das escolas, mas deixam marcas importantes no clima das escolas e na insatisfação profissional dos docentes, que é preciso ter em conta.

Em paralelo, a investigação sobre a qualidade das escolas e sobre as condições do seu funcionamento que podem esbater as diferenças entre alunos, decorrentes da sua origem sócio económica e cultural, vai invadindo o campo da decisão política e condicionando os modelos de avaliação dos alunos, das escolas, dos próprios professores individuais, cada vez mais tornada uma peça fundamental na gestão das suas carreiras.

A avaliação tornou-se um campo científico e político. Simultaneamente, tornou-se uma nova área profissional, com efeitos na constituição de grupos profissionais de avaliadores organizados em associações privadas prestadoras de serviços de avaliação, e com efeitos na alteração do perfil dos que geriam as escolas e dos que na administração pública, tradicionalmente, acompanhavam as escolas e asseguravam o seu controlo e regulação – os inspectores.

A constituição de uma associação das inspecções europeias em 1995, a SICI (Standing International Conference of Inspectorates), de que Portugal foi um dos promotores, veio a tornar-se um importante fórum de debate sobre políticas de inspecção, modelos de avaliação e de troca de experiências, incluindo programas de formação de inspectores.

No final da década de 90, a institucionalização da avaliação das escolas tornou-se um objectivo do Governo português, tendo levado à reorganização das áreas de intervenção inspectiva, e tornando o recrutamento de uma nova geração de inspectores uma prioridade. Aos tradicionais papéis de acompanhamento, controlo e verificação da conformidade que caracterizavam a actividade inspectiva, vem juntar-se a responsabilidade de avaliar as escolas, exigindo uma nova maneira de ser inspector, a começar por deixar de trabalhar como agente individual para passar a ser membro de uma equipa.

A avaliação externa das escolas, tal como foi confiada à Inspecção Geral da Educação, foi concebida como um programa a desenvolver-se em ciclos de seis anos, de modo a avaliar todas as escolas, quer fossem unidades de gestão singulares, ou unidades de gestão em agrupamento de escolas{5}

O modelo orientava-se por “uma filosofia de avaliação global do desempenho das escolas”, - uma “avaliação integrada” em oposição às actividades tradicionais de inspecções fragmentadas por áreas de funcionamento das escolas - e justificava-se pela obrigação de prestar contas do trabalho desenvolvido com as crianças e com os alunos, dos resultados alcançados, e da boa utilização dos recursos. Eram destinatários desta prestação de contas a administração educativa e as comunidades educativas locais, na convicção de que a qualidade das escolas e das experiências de aprendizagem dos alunos é uma responsabilidade colectiva.

“Não haverá responsabilidade de uns pelos outros se não houver informação, pelo que a recolha de informação sistemática de dados através da observação local do desempenho escolar feita por agentes especializados tem uma função estratégica indispensável” (IGE, 2000, p. 9)

A “observação local” incluía a avaliação e discussão dos níveis de sucesso dos alunos, em absoluto e ponderados pelos factores do contexto familiar disponíveis{6}, bem como a sua comparação com o valor esperado do sucesso em cada escola; a análise documental sobre a gestão e organização da escola, incluindo os documentos orientadores do projecto e da vida da escola; a observação da realização do ensino e das aprendizagens em sala de aula, dos processos de avaliação das aprendizagens, bem como a organização e realização dos apoios educativos; e, ainda, a observação do “clima” da escola, tendo em conta aspectos como o relacionamento interpessoal, a participação e a liderança.

A estratégia deste programa e as diferentes operações que o compunham foram cuidadosamente preparadas e apresentadas a cada escola antes da intervenção no terreno. Do mesmo modo, o encerramento de cada intervenção ocorria num prazo curto, tendo como objectivo fazer a apresentação oral e a discussão de uma versão preliminar do Relatório de Avaliação a ser enviado na sua versão escrita, posteriormente.

Não foi um processo isento de sobressaltos para avaliadores e avaliados, todos envolvidos num novo modelo de relacionamento, onde a verificação da conformidade normativa não era o objectivo.  

Se a avaliação iria introduzir uma nova cultura na gestão e direcção das escolas, como acontecera na larga maioria dos países Europeus, a entrada na sala de aula e a observação dos modos como os alunos trabalhavam foi em muitos casos quase um “choque cultural”, apesar de serem as escolas a escolher as aulas a observar.

Nos três anos de duração do projecto foram avaliadas 2039 escolas e observadas 600 salas de actividades na educação pré-escolar e 10.062 aulas e situações de trabalho de aprendizagem nos ciclos da educação básica e secundária.

Foram produzidos 3 relatórios nacionais relativos às intervenções realizadas nos anos lectivos de 1999 / 2000, 2000 /2001 e 2001 /2002.

O balanço de três anos consecutivos de avaliação integrada nas escolas dos diferentes níveis de ensino, permitiu caracterizar o funcionamento e a qualidade do desempenho das escolas de todos os níveis de ensino e o modo como se diferenciavam entre si e identificar pontos fortes e pontos fracos do sistema de escolas. Permitiu sobretudo que as salas de aulas deixassem de ser um enorme conjunto de “jardins secretos”.

A análise dos seis pontos fortes{7} identificados, nesse balanço, mostra que se referem a um campo disperso de qualidade organizacional e relacional que se poderiam organizar em duas categorias: uma refere-se a alguns aspectos da gestão do trabalho das aprendizagens, à dimensão afectiva subjacente a esse trabalho, abrangendo professores e alunos, bem como à atitude face à mudança; a outra categoria refere-se à qualidade dos serviços de psicologia e orientação, sempre referidos em todos os relatórios como funcionando bem, desde que existam.

No que se refere aos 10 pontos fracos, concentram-se na área da gestão do sucesso e do trabalho em sala de aula (8 itens) e na dinâmica da escola (2 itens) referindo-se à participação na vida da escola e à articulação com outras escolas, através de projectos e parcerias.

Os relatórios de avaliação de escola eram documentos longos, escritos numa linguagem nem sempre acessível aos leitores interessados em saber o que se revelava na avaliação das escolas dos seus educandos ou do seu bairro. Como instrumento de prestação de contas eram complexos. Mas as escolas receberam bem a versão escrita daquilo que já sabiam que era a sua avaliação.

Mas não foi pacífica a divulgação dos resultados da avaliação de cada escola e os dados disponíveis não tranquilizaram a opinião pública: alguma comunicação social deu-lhes visibilidade, ao divulgar alguns pontos fortes e fracos por nível de ensino, e foi ao terreno colher dados que situassem em contexto o que o Relatório Nacional avaliava. Em simultâneo, pressionava para a divulgação pública de todos os relatórios de escola, tal como vinha pressionando para a “libertação” dos dados dos resultados dos exames nacionais do ensino secundário e das classificações internas das escolas, de modo a poder fazer a ordenação das escolas e a estabelecer comparações por níveis de ensino e por regiões geográficas, como forma “mais segura” de dar um retrato da qualidade das escolas, como se vinha fazendo em alguns países europeus.

Libertados os dados, a partir de 2001 a comunicação social começou a publicar as listas ordenadas de todas as escolas portuguesas, incluindo as públicas e as privadas, acompanhadas de relatos colhidos no local, que dessem uma visão rápida dos contextos, dos modos como cada escola se via e reagia à avaliação publicada, vários testemunhos na primeira pessoa a dar voz aos dirigentes das escolas, aos pais, aos professores, aos alunos, a investigadores convidados. Para o grande público esta era a “avaliação das escolas” que punha em evidência que as escolas particulares ocupavam quase todos os 20 primeiros lugares e que as escolas públicas tinham piores resultados e que se concentravam nas posições finais da tabela.

O programa do Governo que entrou em funções em 2002, sendo ministro David Justino (2002-2004), trouxe uma nova orientação política ao sector da Educação, com um discurso mais radical a sustentar princípios fundamentais como “defender uma escola assente no respeito por valores, como o trabalho, a disciplina, a exigência, o rigor e a competência em busca da excelência” (…) “prosseguindo metas ambiciosas aferidas internacionalmente e combatendo as assimetrias sociais e regionais”.

Estes princípios, que se filiavam também no programa de reforma e modernização da administração pública, arrastada de governo para governo, haveriam de se tornar o ponto de partida e a bandeira para sustentar a crítica ao sistema escolar herdado dos governos anteriores e para introduzir novas políticas de avaliação de todos os implicados no processo educativo: dos agentes às instituições, dos currículos aos manuais, dos alunos aos diferentes funcionários:

“O Governo considera essencial introduzir a todos os níveis uma cultura de avaliação das instituições, dos docentes, dos funcionários e dos alunos, que tenha consequências no seu desempenho e no desenvolvimento organizacional, profissional e humano”.
a avaliação do desempenho das escolas, com publicitação dos resultados e criação de um sistema de distinção do mérito e de apoio às que demonstrem maiores carências.”

De entre outros enunciados programáticos,destaca-se ainda o propósito, sempre repetido em vários programas de governos com diferentes orientações políticas, de rever o sistema de informação do ME, tornando-o um sistema útil à gestão e à avaliação, coerente e de fácil acesso para a administração e para os cidadãos.

Nos 4 anos de governação, entre 2002 a 2004, tomaram-se várias medidas no campo da avaliação: publicou-se a Lei 31/ 2002 de 20 de Dezembro, sobre a avaliação do sistema Educativo e do ensino não superior onde se especifica a forma como se estrutura a avaliação, os conteúdos a abranger e as entidades coordenadoras; reestruturou-se o Ministério da Educação, extinguindo e fundindo serviços; acabou-se com o sistema de avaliação integrada das escolas que os governos anteriores tinham criado; entregou-se definitivamente à comunicação social a publicitação dos resultados dos exames nacionais do final do ensino secundário, 12º ano, e do final do ensino básico, 9º ano, e das provas aferidas do 4º e 6º anos, respectivamente os anos terminais do 1º e do 2º ciclos da educação básica:

“Os resultados da avaliação das escolas e do sistema educativo, constantes de relatórios de análise integrada, contextualizada e comparada, devem ser divulgados com o objectivo de disponibilizar aos cidadãos em geral e às comunidades educativas em particular uma visão extensiva, actualizada, criticamente reflectida e comparada internacionalmente do sistema educativo português”. (Lei 31/2002, art.º 16º)

Este artigo consagrou em lei a prática de publicação de listas ordenadas das escolas que já se iniciara em 2001. Alguns jornais de maior circulação e prestígio, continuaram a formar parcerias com diferentes entidades, nomeadamente do ensino superior, para o tratamento dos dados disponibilizados e publicação dos resultados de exames e provas aferidas, com diferentes níveis de desagregação, em listas ordenadas das escolas. Em alguns casos, as separatas publicadas constituem cadernos de jornalismo de investigação organizados por equipas de reportagem que percorrem o país, captando retratos e testemunhos sobre a qualidade vivida em diferentes escolas e contextos geográficos e sociais, comparando diferentes fontes de informação, dando voz aos actores do sistema de escolas.

O debate sobre a organização das listas ordenadas das escolas com base nos resultados dos exames como instrumento de avaliação continua em aberto: uns regozijam-se com a vitória de dez anos de publicação de rankings: falam das escolas como unidades periféricas do sistema de administração educativa; outros insurgem-se com a imagem injusta e incompleta que apresentam das escolas: pensam nas escolas como sistemas sociais e organizacionais onde se vive, se trabalha e se aprende, quer se trate de crianças, de jovens ou adultos. São dois objectos de análise e de estudo diferentes, qualquer dos dois maltratados por este método de ordenação e comparação.

 2. “Mais e Meálhor Educação”: enraizar a cultura e a prática de avaliação

Em 2005-2009, com o novo Governo entretanto criado, sendo Ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues, as questões da avaliação voltam a ganhar um novo lugar na política educativa. Sob a epígrafe “Mais e melhor Educação”, o programa deste Governo define cinco propósitos essenciais para a política educativa. Sublinhada a negro no original, a última asserção constitui uma espécie de “trave mestra” do programa:

Enraizar em todas as dimensões do sistema de educação e formação a cultura e a prática da avaliação e da prestação de contas”.

Como alvos e critérios das novas políticas de avaliação, especifica-se e destaca-se no texto original:

“Avaliação do desempenho dos alunos e do currículo nacional, avaliação dos educadores e professores, avaliação, segundo critérios de resultados, eficiência e equidade, das escolas e dos serviços técnicos que as apoiam.”
“… O Governo estimulará a celebração de contratos de autonomia entre as escolas e a administração educativa…”
“…Ao mesmo tempo, lançará um programa nacional de avaliação das escolas básicas e secundárias que considere as dimensões fundamentais do seu trabalho e não se reduza a uma ordenação sumária e acrítica baseada unicamente em notas de alguns exames, potenciando um modelo que tenha em conta os padrões adoptados no âmbito da União Europeia”
A avaliação terá consequências, quer para premiar as boas escolas, quer para torná-las referências para toda a rede, quer para apoiar, nos seus planos de melhoria, as escolas com mais dificuldades”.

2.1. A operacionalização do programa nacional de avaliação de escolas

Para dar corpo a este ponto do programa de governo, foi constituído um grupo de trabalho para estudar e definir os referenciais da auto-avaliação e da avaliação externa dos estabelecimentos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, ”identificando um conjunto de variáveis e parâmetros comuns às práticas de auto-avaliação desenvolvidas nos últimos anos e sugerindo outros parâmetros que as escolas pudessem escolher em função dos seus projectos e das suas condições específicas”. Para a avaliação externa foi igualmente pedida a definição dos respectivos referenciais, devendo ser tido em conta que “deste processo deveriam resultar classificações claras dos estabelecimentos de educação e ensino e recomendações que permitissem preparar a celebração de contratos de autonomia”.

Competia ainda a este grupo de trabalho testar o modelo e a sua metodologia numa amostra de escolas convidadas a candidatarem-se a avaliação externa.

Na construção deste novo programa que viria a ser chamado de “Avaliação Externa das Escolas” tiveram-se em conta diferentes abordagens à avaliação institucional em uso em diferentes países parceiros na União Europeia, o modo como têm sido apresentadas na literatura científica, e os respectivos impactos que têm sido identificados e recapitulou-se o que a Lei 31/2002 sobre a avaliação das escolas dispunha quanto à sua estrutura e enfoques.

De igual modo, recapitularam-se as diversas iniciativas realizadas neste campo em Portugal, sobretudo as que tiveram maior implantação, públicas e privadas, os instrumentos de trabalho e os pontos fortes e fracos identificados quer nos próprios sistemas de avaliação, quer no desempenho das escolas.

2.2. Objectivos, metodologia e instrumentos

Tendo em conta a realidade contextual, o grupo consensualizou a importância de clarificar os objectivos deste programa de avaliação: se por um lado, de acordo com o programa do Governo e com o disposto na Lei, a avaliação tem como objectivo “enraizar a cultura e a prática da prestação de contas”, e se, por outro lado, “toda a avaliação é formativa” (de acordo com Hadji) a avaliação teria como objectivo também produzir informação de retorno às próprias unidades avaliadas que lhes permitisse assegurar a consistência dos processos e dos resultados educativos, para todos.

2.3. O quadro de referência para a avaliação externa

Com esse objectivo em mente, o grupo de trabalho consensualizou um quadro de referência para a avaliação externa, a ser dado a conhecer antecipadamente às escolas. Este visa definir detalhadamente o que se quer avaliar e em que termos se propõe fazê-lo. O seu desenvolvimento fez-se em volta de 5 domínios articulados, que se definem através de uma questão, ou pergunta, apresentada como o fio condutor da avaliação em cada domínio, sintetizando o que se pretende saber em cada um, do seguinte modo:

Domínios de avaliação externa

1. Resultados: Como conhece a escola os resultados dos seus alunos, quais são e o que faz para garanti-los?

2. Prestação do serviço educativo: Para obter esses resultados, que serviço educativo presta e como o presta?

3. Organização e gestão escolar: Como se organiza e é gerida a escola para prestar esse serviço educativo?

4. Liderança: que lideranças tem a escola e que visão e estratégia está por trás da organização e gestão?

5. Capacidade de auto-regulação e progresso da escola: Como garante a escola o controlo e melhoria deste processo?

São estes domínios que, em última instância, serão avaliados de acordo com uma tabela de classificações de quatro níveis (Muito Bom, Bom, Suficiente e Insuficiente) cujos critérios de aplicação foram definidos previamente em termos descritivos.

Cada um destes domínios é, por sua vez, suportado por um conjunto de factores que os operacionalizam.{8}

Para habilitar os avaliadores a desenvolver um trabalho de campo convergente, seguindo o mesmo critério, e para possibilitar às escolas conhecerem esses critérios e prepararem-se para a avaliação externa, foi estabelecido para cada factor um conjunto de perguntas com o propósito de ilustrar diferentes aspectos relevantes a ter em conta na observação e nos diálogos a estabelecer, a gerir conforme a situação e o contexto. Estas perguntas se davam o “mote” para o desenrolar das entrevistas, constituíam não uma listagem do que perguntar, mas um modo de ilustrar como interpelar os actores e assim saber o que conheciam das suas realidades e como as sabiam “ler”, quer em termos de contexto, quer em termos de processos e de resultados.

2.4. O quadro de referência para a auto-avaliação

No que se refere aos referenciais da auto-avaliação, foi decidido não recomendar um modelo específico de auto-avaliação de escola, por diversas razões: primeiro porque todos os modelos são dinâmicos e nesse sentido vão evoluindo com vista a adequarem-se às exigências de melhoria das próprias escolas, conforme a sua realidade e, depois, porque qualquer opção deveria resultar de um acordo entre os vários membros de uma comunidade educativa concreta, que actua dentro de um contexto próprio.

Apesar da diversidade dos modelos, existem aspectos que são transversais a todos, como:

  • A análise detalhada dos resultados das aprendizagens dos alunos,
  • O enfoque no trabalho desenvolvido em sala de aula, com destaque para o modo como os alunos trabalham,
  • O clima e o ambiente educativos
  • A organização e gestão da escola e dos seus recursos.

É também comum uma maior ênfase nas questões qualitativas do processo das aprendizagens dos alunos e na atenção aos aspectos estratégicos da optimização dos recursos e da melhoria dos resultados. Teve-se igualmente como preocupação não confinar a auto-avaliação à produção de dados, segundo um modelo fixo, mas aceitar diferentes modos de o fazer, enfatizando a importância de cada escola saber ler a sua informação, saber interpretá-la para poder agir e saber prestar contas aos diferentes parceiros internos e externos, demonstrando o que foi feito, e os resultados obtidos.

Sabia-se que existia nas escolas uma grande diversidade de experiências e estádios de desenvolvimento dos processos de auto-avaliação, uns sistemáticos e estruturados, outros não estruturados, muitas vezes constituídos por vários episódios de apresentação de resultados dos alunos e sua discussão, ou de apresentação de dados relativos à avaliação dos diversos projectos institucionais previstos nos respectivos Planos de actividade, como recomendado nas normas de orientação da organização escolar.
Tendo em conta esta realidade, o Grupo de Trabalho optou por pedir às escolas que preparassem um texto para a sua apresentação de acordo com uma estrutura comum que lhes foi enviada, assente nos seguintes campos de análise:

  • Contexto e caracterização geral da escola – Qual o impacto, no funcionamento da escola, das características sociológicas dos diferentes núcleos onde se insere?
  • O projecto educativo – Que prioridades lhe estão subjacentes e que objectivos se estabelecem para as áreas mais relevantes?
  • A organização e gestão da escola – Como caracteriza o funcionamento das várias estruturas e órgãos da escola, e como se assegura a qualidade e equidade educativas?
  • Ligação à comunidade – Que articulação com as famílias e com as autarquias e instituições locais?
  • Clima e ambiente educativos – Que importância lhes é atribuída, bem como à educação para a cidadania e à disciplina?
  • Resultados - Como é feita a análise do sucesso dos alunos e como se avaliam os resultados académicos e sociais e o seu impacto?
  • Outros elementos relevantes para a caracterização.

Aquele texto, bem como a sua apresentação oral na abertura do processo de avaliação da escola, podem ser entendidos como um interface entre a auto-avaliação já realizada e a avaliação externa que se segue. Por esta razão os dois quadros de referência organizam-se seguindo a mesma metodologia: para cada campo de análise, identificam-se diferentes aspectos/factores que constituem a estrutura da apresentação comum a todas as escolas. Para cada factor enunciam-se conjuntos de questões que tornam mais preciso o que se pretende saber e o modo de resposta. Para além da resposta directa, deve ainda ser demonstrada a reflexão que foi feita nas escolas e as conclusões a que chegaram.

2.5. O trabalho de campo

Antes de se iniciar o trabalho de campo no calendário previsto, o qual foi dado a conhecer a cada escola com bastante tempo de antecedência, cada equipa de avaliação analisou a documentação solicitada às escolas a avaliar. Para além do relatório de auto-avaliação e do texto de apresentação de escola nos termos propostos, as escolas enviavam os documentos fundamentais de orientação, planeamento e gestão da escola. A leitura desta documentação permite obter uma primeira imagem da instituição: conhecer o contexto social e cultural das famílias dos alunos das escolas do agrupamento, a evolução dos resultados escolares nos últimos três anos, as diferentes ofertas educativas organizadas pela escola previstas no seu plano anual de actividades e saber como tudo se articula com o projecto educativo do Agrupamento. Esta documentação permite formular um conjunto de questões sobre a sua organização e actividade, em articulação com as questões previstas nos documentos de apoio ao trabalho de campo, especificamente o “Quadro de Referência” da avaliação externa.

Durante 3 dias em cada agrupamento uma equipa de três avaliadores, dois inspectores e um avaliador externo (sem ligação à Inspecção Geral da Educação) recrutado predominantemente no ensino superior, desenvolvem o trabalho de campo recolhendo dados a partir das visitas às escolas, da observação directa e dos testemunhos de um largo conjunto de entrevistados em painel, abrangendo um leque variado de elementos da escola e das comunidades locais representando, entre outros, os órgãos de direcção e coordenação da escola, professores com cargos de gestão intermédia, professores sem cargos, pais, alunos, não docentes, representantes dos serviços locais relacionados com a escola – saúde, autoridades municipais, serviços especializados em apoios educativos.

2.6. O Relatório de avaliação
A avaliação externa de cada unidade de gestão conclui-se com o envio de um relatório elaborado pela equipa de avaliadores. Todos os Relatórios obedecem a uma matriz pré -definida, de onde constam:

  • Uma introdução, comum a todos os relatórios, apresentando a actividade.
  • A caracterização da unidade de gestão, contextualizando-a.
  • As conclusões da avaliação em cada domínio e as respectivas classificações.
  • A apreciação dos factores que descrevem ou operacionalizam cada domínio, especificando as evidências que suportam os diferentes juízos de valor e a classificação do domínio.
  • As considerações finais, sintetizando os “pontos fortes”, “os pontos fracos”, as “oportunidades de desenvolvimento que constituem desafios para a melhoria da escola”, e “constrangimentos a ser resolvidos”.{9}

Em documento interno, dirigido aos avaliadores, contendo as orientações para a sua elaboração, explicita-se a preocupação de que o Relatório “seja simples, útil e de fácil exequibilidade, considerando os diferentes destinatários”.
Cada relatório é enviado à respectiva escola, que, por lei, tem um prazo  de 10 dias para apresentar o seu contraditório.
Todas as alterações introduzidas no texto por força do contraditório são assinaladas, apresentando a versão original e a versão corrigida.
Entre 2006/2007 e 2009/2010, foram elaborados, enviados às escolas e publicados no sítio da IGE, 984 relatórios e 314 contraditórios. Estes valores globais têm uma distribuição variável em cada um dos anos lectivos e em cada uma das cinco regiões em que se divide o território nacional. Não deixa de ser significativo que cerca de 32%  das escolas tenham sentido necessidade de se pronunciarem em sede de contraditório, quanto à apreciação e ou classificação que foi feita.

2.7. A avaliação anual do processo

No final de cada ano é aplicado a todas as escolas avaliadas e respectivos avaliadores um inquérito por questionário, estruturado num conjunto de questões de resposta fechada e algumas de resposta aberta sobre o processo em si, incluindo os instrumentos utilizados, o modo como as escolas se prepararam para a avaliação, o trabalho dos avaliadores, o relatório de avaliação externa, aspectos e propostas a melhorar neste processo.

De um modo geral as respostas das escolas são muito positivas quer para as equipas de avaliação, quer para a Inspecção Geral de Educação, que, dizem, foram capazes de criar um ambiente de cordialidade e abertura que os surpreendeu.

A generalidade dos inquiridos concorda com os instrumentos utilizados e com o modo da sua aplicação, considerando-os facilitadores dos processos de auto-avaliação e de avaliação externa, mas põem em destaque um conjunto de aspectos omissos que seria importante apreciar no âmbito da avaliação das escolas, mas que nem o tempo dedicado a esta intervenção, 3 dias, nem a concepção do modelo o permite fazer.

Na apreciação que fazem dos Relatórios individuais por escola verifica-se um grande número de referências negativas à “justiça das apreciações”, em consonância com o número de contraditórios recebidos. Referem-se às inúmeras coisas que não foram vistas e, num tom de discurso de protesto e agressivo, alguns afirmam  “não nos revemos nesta apreciação”

Um largo número de escolas envia contraditórios apenas a identificar pequenas gralhas, ou propostas de uma redacção ligeiramente mais precisa para ser mais verdadeira. Outros contestam as classificações e as descrições de desempenho e referem que “não existe relação entre o descrito e as menções qualitativas atribuídas”, sublinham a não consistência de critérios que leva a que “textos semelhantes nos descritivos correspondam a menções qualitativas diferentes”, ou “a excessiva ênfase nos aspectos negativos”. Consideram que este “é um modelo subjectivo” e que é preciso evitar “ambiguidades na avaliação”. Outros argumentam que “não se podem utilizar os mesmos parâmetros em todas as escolas sem ter em conta a realidade de cada uma” que não vêem ter sido suficientemente ponderada e sublinham ”o contexto” como condicionante a ter em conta na avaliação do desempenho.

Quanto à avaliação que os avaliadores fazem do processo de avaliação externa, mantém-se constante o seu modo de resposta positiva ao longo dos quatro anos de auto-avaliação do projecto. Referem-se, no entanto, a um conjunto de observações sobre aspectos a melhorar, nomeadamente o que se refere à informação de caracterização das escolas recolhida e tratada pelos serviços da administração, o tempo demasiado curto para a realização do trabalho de campo da avaliação e a operacionalização dos níveis da escala de classificação.

 3. Preparar o novo ciclo de avaliação: ajustamentos e melhorias

Em 2011 concluir-se-á o ciclo de avaliação de todas as escolas portuguesas. Parece ser consensual que se deve procurar estabilizar o modelo actual, devendo promover-se um debate alargado fundamentado em investigação sobre este processo, sobre os seus pontos fortes e fracos antes da sua revisão e aprofundamento.

A leitura dos relatórios e respectivos contraditórios, bem como os comentários de avaliadores e avaliados, e os estudos em curso, sugerem vários aspectos concretos que merecem ser reajustados, nomeadamente:

i) O quadro de referência para a avaliação externa é extenso e complexo. Será preciso voltar a analisar a sua matriz e identificar o que está a mais ou precisa de ser reescrito. Por exemplo, deve ser questionado se os factores seleccionados se mantêm com a mesma pertinência que nos pareceu quando foi feita a primeira redacção, ou se não haverá redundâncias e, portanto, sobreposição de áreas a avaliar.

Também não é seguro que haja exemplos certos de perguntas que interpelem quem trabalha nos jardins-de-infância ou nas escolas do 1º ciclo, tal como faltarão as questões que se dirijam às especificidades dos outros níveis de ensino.

ii) Ao privilegiar-se uma perspectiva generalista de agrupamento, não é seguro que através dos relatórios se fique a saber com clareza:

  • Que níveis de ensino, ou que grupos de alunos, são considerados “críticos” nos seus processos de aprendizagem e percursos escolares;
  • Como se garante a sustentabilidade para a melhoria: quem acompanha, apoia, capacita as escolas e os seus actores na sua acção e auto-regulação, de forma sistemática.
  • O que deixou de ser feito por falta de autonomia.

iii) É importante referir que predominam os relatórios muito bem escritos, precisos na informação, concisos no texto e consistentes nos comentários e na respectiva avaliação. Tal decorre não só do modo como se descrevem e apreciam os factores, mas como se organiza a síntese por domínio e se atribui a respectiva classificação.

Mas é igualmente importante garantir que todos os destinatários dos relatórios percebem o que está escrito. O discurso tem de ser mais simples, menos técnico, menos orientado para os docentes e técnicos de educação, dentro de uma linguagem comum que todos os cidadãos entendam. Um dos objectivos da avaliação diz respeito ao envolvimento e responsabilização de todos os parceiros da comunidade local na vida da escola e no respectivo processo de avaliação. O relatório não pode ser um instrumento de exclusão

iv) Apesar de alguns ajustamentos entretanto introduzidos nos instrumentos e nos procedimentos de avaliação externa, bem como do investimento feito na formação dos avaliadores, a leitura sistemática dos Relatórios de Avaliação sugere que outro tipo de ajustamentos deveriam ser realizados antes de se entrar num novo ciclo de intervenções em 2011/2012. Algumas debilidades dos relatórios, quer em termos de forma, quer de conteúdo, podem reflectir-se na credibilidade da própria avaliação. Seleccionámos, por isso, quatro aspectos que se consideram fundamentais para melhorar a função de prestação de contas e a função de feedback para potenciar a melhoria da escola, nomeadamente:

  • Um tratamento mais consistente dos resultados educativos dos alunos, de modo a terem a relevância que merecem. No caso dos resultados académicos, na ausência de metodologias mais elaboradas como o cálculo do valor acrescentado, a ser desenvolvidas e disponibilizadas pelos serviços centrais de estatísticas e informação, é importante conhecer pelo menos a distribuição dos níveis de classificações alcançados nas diferentes disciplinas do currículo, ou o percurso de cohortes de alunos, e saber como se correlacionam com o estatuto familiar dos alunos. No caso dos resultados sociais, afectivos ou de atitudes e expectativas face à escola, as evidências apresentadas nem sempre são sustentadas por recolhas e análises rigorosas, mas em relatos impressionistas. Não quer isto dizer que não sejam verdadeiros, mas não são rigorosos e podiam sê-lo.
  • O insuficiente tempo para o trabalho de campo. Este facto pode ter como efeito o recurso a um discurso defensivo por parte dos avaliadores, que dispõem essencialmente de um conjunto de impressões que recolheram nas suas observações e nos testemunhos dos entrevistados, mas que não tiveram tempo de triangular para testar a sua consistência e formular um juízo de valor sustentado em evidências claras, seguras.
  • A revisão dos modos de definição e tratamento dos níveis de classificação. O seu carácter descritivo e qualitativo não está isento de interpretações e aplicações subjectivas, tornando possível a atribuição de classificações diferentes a descritivos iguais de domínios observados. O mesmo acontece com a identificação dos pontos fortes e fracos apresentados nas considerações finais, que por vezes expressam opiniões e não juízos fundados em critérios escrutináveis. 
  • O conhecimento que todos na escola têm da sua auto-avaliação interna, como a trabalharam e o que fizeram com ela. Para isso é preciso reportar a divulgação que foi feita, como foi apresentada e discutida, as consequências que houve no planeamento geral dos departamentos e dos professores individualmente, na organização e gestão dos recursos e na consecução dos objectivos de curto e médio prazo enunciados. Isto é, como se articularam e coordenaram entre si nos processos para conseguir resultados melhores: como partilharam práticas e reflectiram acerca dos resultados quer de modo informal, quer formalmente, onde encontraram os apoios e as lideranças necessárias. Não são claras as dinâmicas suscitadas pela auto-avaliação.

Para além de ajustamentos deste tipo, é preciso, também:

  • Compilar ou produzir material de apoio a usar em auto-formação de avaliadores e avaliados, que ajude a explicitar os aspectos menos claros e as mensagens “demasiado implícitas” dos dois quadros de referência utilizados.
  • Promover, com recurso a diferentes entidades formadoras, oportunidades de formação para todos os avaliadores, recorrendo a actividades / exercícios práticos de avaliação, de análise e de redacção de relatórios.

Em conclusão, melhorar o que temos é um desafio maior e mais estimulante do que anular o que foi feito e começar de novo. Iniciar um novo ciclo é uma oportunidade de aprender e de melhorar. Por isso, importa querer saber o que a comunidade científica e as comunidades locais, avaliadores e avaliados pensam como se pode tornar os instrumentos de trabalho mais adequados. Mas é também uma oportunidade para rever os pontos fortes dos vários programas de avaliação das escolas em Portugal e as palavras-chave que foram as suas “bandeiras” ou princípios orientadores:

  • Garantir a qualidade – ter informação e saber produzir conhecimento sobre a qualidade da escola.
  • Orientar-se para a excelência, manifestada nos seus oito conceitos fundamentais e garantir um ciclo contínuo de qualidade.
  • Melhorar o desempenho de uma forma integrada, a partir dos processos de trabalho em sala de aula.
  • Interpelar a consistência dos processos seguidos e dos resultados alcançados para todos.

Eles mostram-nos que a avaliação perfeita não existe, mas vai-se construindo progressivamente. Mostram-nos, também, que nos últimos 20 anos a avaliação tornou-se um processo cada vez mais crítico, mais exigente, mais complexo, mais profissional, mais técnico, mas mais centrado nas pessoas e no seu desenvolvimento.

 

Referencias Bibliográficas

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{1} In Programa de Governo, sendo ministro da Educação Roberto Carneiro (1987/1991)

{2} Decreto – lei 43/89, de 3 de Fevereiro

{3} O projecto  INES ( Indicadores Internacionais dos Sistemas Educativos) foi lançado na Conferência Internacional de Washington em 1987 e tinha como objectivo planear um sistema de indicadores que  pudessem ser utilizados na monitorização e na análise comparada dos sistemas educativos. Em 1989 foi possível acordar numa  estrutura de indicadores em 4 áreas consideradas fundamentais na avaliação dos sistemas educativos, dando origem à criação de 4 redes  ou equipas de trabalho focalizadas em domínios específicos: as aprendizagens dos alunos (rede A), a educação e o mercado de trabalho (rede B), as escolas e os processos escolares (rede C) e expectativas e atitudes dos parceiros sociais face à educação (rede D). A cada uma destas redes cabia analisar o tipo de informação disponível nos sistemas de informação estatística nacionais, analisar e garantir a qualidade da informação recolhida, rever a operacionalização dos indicadores já estabelecidos e estudar metodologias de cálculo de outras medidas que a investigação sobre a equidade e a qualidade dos processos educativos vinha a indicar como relevantes. No domínio da rede C, a selecção dos indicadores para a comparabilidade internacional distribuíam-se em quatro categorias: os recursos humanos, os processos de decisão, o currículo, e os processos de organização e ensino a nível de escola. Deste trabalho global resultou publicação de vários relatórios parcelares e os relatórios anuais do programa INES “Education at a Glance” e o volume que o acompanha “Education Policy Analysis”, focalizado na análise e comparação de áreas específicas da política educativa.

{4} Estamo-nos a referir ao modelo CAF (Common Assessment Framework), decorrente da adaptação do modelo EFQM para a avaliação dos serviços públicos no espaço europeu.

{5} Para assegurar melhor acesso à educação e aos seus recursos, incluindo uma maior racionalização na gestão dos recursos, e para garantir a coerência e sequencialidade dos percursos escolares dos alunos, os jardins-de-infância (educação pré-escolar) e as escolas básicas foram integrados numa única unidade de gestão, o agrupamento, num determinado território educativo, cuja sede de gestão é assumida pela escola do 3º ciclo, o ciclo final da escolaridade obrigatória. Conforme as características da rede escolar e a distribuição da população escolar, vários agrupamentos integram também o ciclo secundário, ficando a escola sede do agrupamento instalada na escola secundária. Cada agrupamento é, assim, uma “escola” feita de muitas escolas dispersas por muitos sítios, com os mesmos órgãos de direcção e gestão. Neste texto usamos o conceito de escola para significar a unidade singular ou o agrupamento.

{6} Para ponderar os factores de contexto familiar utilizou-se a variável “nível de carência económica” medido pela “elegibilidade para apoios económicos escolares”.

{7} Todos os itens são avaliados numa escala qualitativa de 4 níveis de A a D, correspondentes a Muito Bom (A), Bom (B), Suficiente (C) e Insuficiente (D). São considerados “ponto fortes” os itens observados com medianas de nível B e pelo menos 25% de avaliações de nível A. São considerados “pontos fracos” os itens observados com medianas de nível C.

{8} Ver Anexos 1 e 2.

{9} Ver Anexo 3.

 

 

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